(Aviso: este não é, muito provavelmente, um texto isento. Mas é, com certeza, um momento em que poderá descontrair enquanto se fala de algo mais sério. Se hoje, o seu índice de humor está baixo, mais vale comer um chocolate e só depois se aventurar nesta demanda.)
No passado domingo, 19 de setembro, passava um pouco das 21:30, quando os tirsenses tiveram a possibilidade de trocar a Gala do BB ou a “La Casa de Papel” da Netflix, por um inédito Debate, em resposta às Eleições Autárquicas Portuguesas 2021, que terão lugar no último domingo de setembro. O evento materializado pelo órgão de informação regional, Diário de Santo Tirso, possibilitou livremente que, através das suas redes sociais, os tirsenses assistissem ao único debate realizado nestes moldes, em que todos os candidatos, ao lugar cimeiro da autarquia, participaram. Bem, não participaram todos da mesma forma, nem com a mesma intensidade mas, para não faltar nada ao Tirsense, que não assistiu (ainda estão a tempo), não pude deixar de fazer este breve resumo daquilo que foram as intervenções dos atuais seis candidatos: Alberto Costa (Partido Socialista), Carlos Alves (Valorizar +), José Magalhães (CDU), Ana Isabel Silva (Bloco de Esquerda), Joana Guimarães (CHEGA) e Henrique Pinheiro (Prá Frente Santo Tirso).
Após uma pequena introdução acerca do concelho de Santo Tirso, por forma a traduzi-lo nos seus números atuais e de localização, o moderador, Nuno Silva, dá o mote para as regras da condução do Debate: questões direcionadas individualmente, tempo equitativo, sem confronto direto e todo um auditório de semblantes, que mais fazia lembrar a leitura do guião do último episódio de “Game of Thrones”. Ora, os tronos dos argumentos a gladiar eram outros, e passarei em resumo o desempenho de cada um dos candidatos à autarquia de Santo Tirso, por ordem alfabética, para não ferir suscetibilidades:~
Alberto Costa (PS)
É o candidato que saiu primeiro da casa de partida e tem o avanço de estar como atual presidente em funções, posição essa assumida legitimamente (parafraseando o próprio) devido ao assunto que não pode ser pronunciado como o Voldemort, sabem: qual é a autarquia que se preze que não tem um elefante na sala?
Quer gostemos ou não, foi evidente alguma estaleca no que toca a presença, preparação (e aquele monte de dossiers?) e capacidade de encaixe dos argumentos flechados pelos seus opositores – nunca ouvi a palavra “saneamento” tantas vezes seguidas e o candidato há que tirar notas: imaginem as vezes que ele escreveu essa palavra, repetida ao expoente da loucura…já para não falar do imbróglio da renegociação com a INDAQUA. E do feito hercúleo de reduzir a fatura da água, para o comum dos tirsenses, em cerca de oito euros por mês: já dá para umas tapas e uns copos no Cor-de-Vinho, por isso, não foi um mau negócio! “Podia até ser de graça”, segundo o mesmo, e reconheço que não desagradaria, mas depois reconheci um laivo de ironia.
Afiança que tem o melhor projeto político, com as provas dadas – o trabalho feito – a resposta no terreno: tudo o que imaginem que ficaria bem num cartaz de estrada, portanto. Ainda teve tempo para a alfinetada da demagogia aos restantes, e uma tirada assinalável foi de que “uma coisa dita muitas vezes até parece que é verdade” – o chamado efeito placebo político (acabei de inventar).
Registo com agrado o seu apelo final ao voto, para que os tirsenses tomem as rédeas do seu futuro.
Ana Isabel Silva (BE)
A candidata do BE que faz lembrar a Daniela Melchior no Suiced Squad, mas com menos fuligem na cara, adotou aquilo a que podemos chamar coerência no meio envolvente: se queremos que nos levem a sério na consciência urgente da questão climática, levamos uma garrafa reutilizável – tomem nota.
Se há alguma citação que resume a intervenção da candidata é esta: “vim aqui para trazer propostas e não para discutir resultados”, o que para leigos quer dizer que “sabemos que não vamos ser eleitos mas estamos aqui para iniciar e consolidar uma posição, reconhecerem a nossa presença: pois o que é visto pode ser lembrado.”
A tenra idade não foi desculpa para comparecer sem trabalho de casa feito e, tanto na introdução como na conclusão, rotulou esta investida como uma candidatura de afirmação: com esperança, trabalho agora iniciado, disruptiva (o sistema já não lhes serve), para uma cidade que integra, que promove a igualdade, que pretende dar a voz aos jovens, mesmo que quem esteja no poder não tenha interesse.
Não posso deixar de enaltecer o propósito de tratamento diferenciado das empresas, tendo em conta a precariedade, lucro e índice de poluição ou, ainda, de ter sido a única candidata a falar no Cineteatro de Santo Tirso (aquela revolta íntima que não quer calar) que é renegado há anos a fios, continuando a céu aberto.
Não interessando se me sinto tirsense de primeira ou de segunda, arranja-se um autógrafo do Idris Elba, por acaso?
Carlos Alves (Valorizar +)
O primeiro candidato da ala direita faz lembrar o Mister Miyagi nos seus anos áureos de juventude e rebeldia e, para quebrar o gelo, não há nada como uma boa metáfora futebolística, de acordo? Isso e começar com “É assim…”, cai-nos logo no goto, certo?
Continuando, não obstante a confiança e o ímpeto apresentados, a defesa de argumentos do candidato foi um desconsolo gastronómico. Continuando nas metáforas, imaginem ir ao Mindus e ele não ter bifinhos com molho de francesinha – tal e qual.
Mas não se podem queixar das várias lições de gestão caseiras: renegoceiam com a MEO se não estão satisfeitos, já sabem, pois, os contratos são para cumprir, apenas se nos beneficiar, evidentemente. E já que qualquer um pode fazer o Alerta CM!, qualquer funcionário da Câmara pega no smartphone e tiras as fotos oficiais dos eventos – convém, é não trocar as contas do Facebook para que conteúdos menos próprios não circulem por parte da CMST.
No Bingo das Embirrações da Atual Gestão, foi saindo “Saneamento”, “Transparência Municipal”, “Contrato com a INDAQUA – nunca vi!”, e o candidato, entre consultas aos comentários do direto, lá ia somado os temas até que, por fim, gritou “Bingo!” e rematou, por entre os seus “portanto”, que o seu programa e da sua equipa era baseado nos sentimentos dos tirsenses (das “pessoas de bem”, espera onde é que já ouvi isto?), com promessas concretizáveis, uma visão de médio/longo prazo, com uma estratégia e um plano definidos (e para o debate, se calhar, já trazíamos qualquer coisita preparada, não?).
Henrique Pinheiro (Prá Frente Santo Tirso)
Tive dificuldades em concentrar-me inicialmente, pois achei que o Ian McKellen tinha abraçado a política no Thyrso. Entretanto, com o remexer da papelada e coçar na cabeça, distanciei-me dessa ideia, e percebi que a liberdade logística dada ao candidato (isto de não ter o cajado do Gandalf para recolher assinaturas, dificulta em muito a tarefa) permitiu-lhe desenvolver uma estratégia tão clara como as orientações para montar estantes do Ikea.
As intervenções deste candidato foram férteis em frases, que facilmente tornar-se-iam icónicas, ao nível mesmo do slogan do Azeite Gallo, lembram-se? E já que tocamos nesse ponto, falou-se tanto da “derrama”, que a minha mente só processava “oh rama, oh que linda rama”, e babava pela batatas cozidas, na noite da consoada. Para o Natal, ainda falta todo um Outono e para os menos entendidos, a derrama municipal é um imposto municipal que incide sobre o lucro tributável decorrente do exercício do período fiscal anterior, das pessoas coletivas, escusam de “googlar”, pois já vos diz o trabalhinho todo.
Antes do pequeno quid pro quo acerca do timing para a alegação final, ouviram-se tiradas várias: “está tudo dito”, “dourar a pílula”, “foi uma grande trapalhada”, “descalabro” e “Santo Tirso é de todos” – ainda que não pareça isto foi um apanhado aleatório, mas verídico. A alegação final – desta vez, a sério – culminou num discurso que ilustrava a imagem do Paraíso para todo um atual cenário dantesco, com direito a Purgatório e Inferno. Propostas? Temos e estão a chegar a vossas casas, pela hora. Confesso, ainda esperei secretamente que ele gritasse “Run, you fools!”.
Joana Guimarães (CHEGA)
Estou sempre à espera de que os candidatos deixem o melhor para fim: uma espécie de sequência Fibonacci argumentativa, um crescendo. Não foi o que aconteceu com esta candidata. Sou da opinião até que foi pescadinha de rabo-na-boca: começámos com a oportunidade de fazer a mudança e terminámos na compreensão da insatisfação geral, para votar na mudança. A grande proposta, grande bandeira desta primeira representação em eleições, em Santo Tirso, é cuidar dos tirsenses. Excelente, já tenho até um nome: Joanacare. Não foi percetível em que é que isto traduzir-se-ia, mas como o saneamento básico é básico, tenho para mim que esta seria uma das prioridades. Isso e vender aqueles bancos de mármore em frente ao Hospital, pois estes nem a sua função elementar cumprem (traseiros nem vê-los), e, há que aproveitar esse dinheirito para colocar mais que 1G de rede, nas casas dos Tirsenses. A candidata protagonizou o momento mais tenso do debate, quando há um esboço de interrupção do candidato do Partido Socialista: lapsos perdoáveis de quem é inexperiente, contudo, até nós nos resignávamos perante aquele olhar fulminante de Alberto Costa. Ficámos bem serviços de citações marcantes, como estas: “não sou de dizer mal de tudo”, “Santo Tirso é uma cidade para inglês ver”, “não tenho problemas em dizer em quem voto” ou “não se mistura política com família”, amén.
A generosidade da candidata não se fica por aqui e, para se redimir daquele abalroamento ao candidato do PS, deu-lhe ainda a dica, que na próxima pandemia era de bom-tom a autarquia fazer chegar máscaras à “gente de bem” deste Concelho.
José Magalhães (CDU)
Por último, temos o candidato que faz lembrar o Bob Dylan mas que esqueceu-se de “One more cup of coffee for the road”. Verdade seja dita, acho que saltou o módulo da “Vivacidade” no curso de oradores TED – em vez de água, podiam ter um colocado um Redbull, todavia a competência não se coloca à mesa.
Este candidato deu protagonismo ao tema da habituação: apostar na requalificação dos prédios devolutos e providenciar habituação pública, com rendas acessíveis (atenção que habitação pública é diferente de habitação social, afinal, não queremos “criar guetos fora do centro”). Apesar de um início periclitante, quando chegada a altura de fazer All in (tem uma ótima poker face), senti-me a ver um vídeo em timelapse, tal o discorrer argumentativo. Mudar de paradigma, não havia necessidade (ler com o sotaque do Herman) até porque se afirmou com o programa mais completo, o verdadeiro voto útil, trazendo projetos vários no que toca ao saneamento (eu avisei), gestão ambiental e desagregação de freguesias, por exemplo.
Denotei algum saudosismo no discurso, salpicado aqui e ali com aquela estratégia de evidenciar o menos positivo na atual administração (voltar ao “pecado original”, que profundo), contudo, existiu o assumir do papel de oposição construtiva, o que é salutar, pois não basta quem assume a pasta mas, de igual forma, quem esteja frente-a-frente para ripostar e dialogar (não têm de ser antagónicos), desabrochando daí ideias e medidas que melhorem a vida de toda a comunidade.
Foi este o resumo de uma noite histórica. Bem sei, que bastava dar voltinhas à Rotunda Timor Lorosae para conhecerem os candidatos, mas seria muito menos divertido – e não vale conduzir ébrios.
É imprescindível exercer o direito de voto, como diz o Nuno Silva no final, “votar é um dever cívico e um direito adquirido com a democracia” e, acrescento ainda, que é um ato que deveria ser celebrado, com direito a arrumada mas às urnas, tal a magia deste sentimento de poder fazer parte. Façam parte do poder de escolher.
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